terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Julia Bosco e seu tempo

Foto: Ancar Barcalla

Durante um considerável período - ou talvez, desde sempre - Julia Bosco tecia, ‘clandestinamente’, o desejo de cantar. Intuitivamente, fazia dessa costura ‘para dentro’ um longo momento de reflexão que hoje a espelha em veste de cantora e compositora. O tempo, "compositor de destinos e tambor de todos os ritmos", como na oração de Caetano Veloso, seu eterno referencial, foi agente determinante para que ela chegasse em seu primeiro disco, não por acaso, chamado "Tempo". A produção independente pilotada por Plinio Profeta e Fabio Santanna - que assina sozinho quatro das 13 faixas e outras nove em parceria com Julia - foi gravada em 2011 com as luminosas presenças de Marcos Valle e João Bosco e começa a ser distribuída em janeiro de 2012, via Tratore.


Confira o bate papo com a cantora!


NaVeia - Como é gravar um disco em casa? Claro, que tem toda a liberdade e sem compromissos com horários, mas pinta aquela preguiça às vezes?

Julia Bosco - O disco na verdade foi pré-produzido em casa, mas as gravações finais foram feitas em estúdio mesmo. O que a gente (eu e os dois produtores) optou por fazer foi aproveitar alguns sons desta pré para as gravações definitivas, porque queríamos manter a sonoridade inicial sem perder o clima... Houve preocupação com horários normalmente! E a preguiça não costuma aparecer quando a gente faz alguma coisa que gosta muito, pelo contrário, o que toma conta da gente é a ansiedade de querer fazer tudo logo. Às vezes é preciso até desacelerar um pouco, para não atropelar o processo.


NaVeia - Seu marido foi produtor no seu disco e também parceiro em muitas músicas. Neste caso, fica difícil não levar o trabalho pra casa né?

Julia Bosco - Na verdade, esta ordem é um pouco confusa até hoje! A gente estabeleceu as duas relações, profissional e pessoal, quase que simultaneamente e então levar trabalho para casa ou romance para o estúdio passou a ser uma rotina normal, sem que a gente conseguisse dissociar uma coisa da outra...

Foto: Ancar Barcalla


NaVeia - Começar uma carreira depois dos 30 anos foi uma opção sua? Quais os prós e contras desta decisão?

Julia Bosco - Foi uma opção esperar, mas não foi uma opção determinar a data. A chegada dos 30 anos trouxeram muita reflexão para a minha vida, acho que é natural de algumas mulheres encarar Balzac de frente e não de rabo de olho, e comigo foi assim: quis olhar mais para dentro de mim, quis entrar nos vazios e ver de que forma eu poderia tentar preenche-los, e com isso a música assumiu seu lugar de destaque. Ainda não sei dos prós e contras, devo saber daqui a pouco, conforme o resultado deste primeiro trabalho for se consolidando. Mas prefiro não pensar assim, prefiro pensar no trabalho que eu tenho que fazer e assim procurar fazê-lo da melhor forma possível.


NaVeia - Antes, você trabalhava na Petrobras, uma área totalmente oposta a música. O que tirou de positivo durante o período que ficou na estatal e levou para música?

Julia Bosco - Era um ofício como são todos os outros e eu encarava da maneira como encaro meu ofício atual, que é a música: com responsabilidade, vontade de aprender, ambição e bom humor! Trouxe comigo o sentido de trabalho de equipe, porque é muito mais fácil alcançar o sucesso quando se tem aliados, parceiros ao seu lado. Isso me ajuda no trabalho com a equipe que está comigo apostando nesta nova empreitada, com os músicos que me acompanham, com todo mundo que "compra meu barulho", por assim dizer.

NaVeia - E como é agora se aventurar no mercado fonográfico?

Julia Bosco - Foi uma escolha muito ponderada: sem devaneios, sem sonhos infantis ou megalomanias: muita vontade de trabalhar, de cantar minhas músicas e conquistar um lugar em meio a toda essa gente bronzeada que mostra o seu valor!

NaVeia - O que o "tempo" representa pra você?

Julia Bosco - Ah, o tempo é que dá o tom! Esta minha trajetória musical só está sendo possível porque o tempo ficou ao meu lado e esperou que eu amadurecesse o bastante para deixar aflorar a Julia Bosco cantora. Nada mais justo que eu o agradecesse dando este nome ao disco: TEMPO.


NaVeia - Como foi a experiência de gravar com seu pai? Ele deu palpite?

Julia Bosco - Foi emocionante, mas muito natural. Eu estava super feliz por ele ter aceitado o convite, os meninos (Fabio e Plínio) também, e quando a gravação aconteceu foi tudo bem familiar e tranquilo, porque o cara é fera! Ele não deu palpite no disco, porque eu não ia ficar pedindo ajuda pro papai, né? (risos) Nós o convidamos, entregamos a música a ele e dissemos: "esse vazio aí é para você preencher como quiser com o seu violão". Então ele ficou livre para criar o arranjo que quisesse.

NaVeia - E para terminar, o que você anda escutando e cantando por aí...

Julia Bosco - Eu sou de fases e repetições: encrenco com um disco ou dois e fico neles dias, semanas... Às vezes volto a uns discos antigos e retomo este processo de ouvi-los à exaustão! Uma loucura. Neste momento, voltei ao "Mina d'água do meu canto", disco da Gal em que ela canta somente canções de Chico e Caetano, e que tem uma gravação de "O ciúme" que é a coisa mais linda do mundo! De dois em dois anos esse disco volta a ser um dos mais tocados no meu iPod. Quanto ao que ando cantando: repertório 100% Julia Bosco! Estou começando os ensaios do meu show de lançamento aqui no Rio, escolhendo o roteiro, experimentando as músicas, uma delícia.

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